Retirar na Loja is the New Black

Blue is the New Black, evento do facebook
Artigo de Leonardo Brossa

Ontem estive no “Blue is the New Black”, evento do Facebook que se propõe a dar um pontapé inicial nos preparativos da Black Friday. A ideia é simples: apresentar estudos de mercado, cases e novidades sobre as suas plataformas para ajudar seus clientes, marcas de varejo em geral, a obterem melhores resultados na data mais esperada do e-commerce.

O evento é super bem planejado e vendedor, mas a ideia desse artigo é explorar, de forma preliminar, um ponto específico que despertou a minha curiosidade e não fazer uma espécie de cobertura do que rolou no dia. E o que me fez ficar pensando até agora foi o crescimento da retirada de produtos nas lojas físicas. Ou seja, as pessoas compram online e vão até um lugar pegar seu produto.


Tem que ser quente e rápido

É natural que o nosso mercado crie expressões, nomenclaturas e metodologias para encurtar espaços. Hoje uma delas surgiu: “geração microondas”. Querem tudo quente e rápido. Confesso que gosto do conceito. Tem aderência com esse novo consumidor que está comendo e fotografando ao mesmo tempo, assistindo TV com um olho e vendo outro vídeo no celular com outro e que não sabe se assiste, filma ou bate palmas pro pôr do sol. E sempre que esse comportamento é apresentado ele recebe um toque de frivolidade, como eu dei. 😉

Mas hoje ele foi usado duas vezes para justificar o crescimento de um comportamento. Comprar online e pedir para retirar na loja. Sim, é crescente. Cada vez mais pessoas compram seus produtos e “não conseguem esperar, preferem tirar na loja e sair com ele embaixo do braço”. Os dados mostram que 58% acham que isso faz todo sentido e 25% já fazem isso. O varejo está de olho. Eu mesmo fiquei de olho. Mas a gente fala sobre isso depois.


No Brasil nada é tão simples quanto parece

O que me deixou intrigado foi ver uma informação tão interessante como essa sendo tratada com certa lateralidade. Claro, o Facebook não tem serviço de entrega nem solução, ainda, pra isso. Eu quase levantei nas duas vezes e pedi pra abrirem os dados e me contarem quem é essa pessoa que compra no digital e vai buscar na loja. Não pode ser só “ansiedade”. Como estamos falando de Brasil vale sempre dar um passo atrás e buscar contexto. Foi o que fiz. Bati em alguns pontos. Vamos a eles:

1. Credibilidade dos Correios
Se tem um serviço que a gente deixou de confiar há anos é o dos Correios. Como boa parte do e-commerce nacional está ancorado nele… Sim, algumas pessoas estão ansiosas, mas outras estão mesmo é preocupadas pois sabem que o produto pode nem chegar.

2. Roubo de Cargas
Só em 2016 foram 1,4 bilhões de reais. Se já não bastasse a desconfiança com os correios… Esse crime que cresce, leva junto o número de pessoas que ficam frustadas com entrega e passam a ir buscar seus produtos onde quer que ele esteja.

3. Profissão Ex-Doméstica
Dois movimentos distintos começaram a extinguir a profissão “doméstica”. Em 2013, empurradas pelo crescimento do país e da educação nos anos anteriores, o número de domésticas chegou ao resultado mais baixo desde 2003. Foi nesse ano também que houve a regulação da profissão, com a PEC das Domésticas. Mas com a chegada da crise, 2015 e 2016, muitas domésticas foram demitidas e passaram a trabalhar como diaristas. E o que isso tem a ver com o “retirar na loja”? Casas vazias sem ninguém para receber as compras.

4. Nem Trabalha Nem Estuda
Mais um dado que tem dois caminhos distintos, mas a verdade é que desde 2015 o percentual de jovens que não trabalham e não estudam está caindo. Tiveram que ir pra rua ajudar a família. Se antes ficavam em casa, agora não tem ninguém pra receber as entregas.

5. É só a Tal Internet Mesmo
Esse ponto surgiu de um papo com meu sócio, o Rafael Ferrer. E se não tem nada disso? Foi só a facilidade que a internet trouxe para pesquisar produtos e preços que se juntou ao desejo natural de ir na loja e levar seu produto pra casa…


Uma tentativa de concluir

O objetivo aqui não é desconsiderar o pensamento da “geração microondas”, muito pelo contrário, a ideia é apenas provocar o quanto devemos estar atentos às características e ao contexto local. Usar os caminhos já percorridos pode ser muito bom na hora de planejar, mas descobrir as nuances no meio do caminho pode ser fatal para um negócio ou campanha.

Os dados do E-bit mostram que as duas principais características das lojas que fazem uma pessoa comprar online são a confiança e o prazo de entrega, ambas cresceram em relação ao ano passado. Para enriquecer a discussão vale lembrar que o sistema de lockers, tão usado nos EUA e Europa, já está sendo visto com muito carinho por varejistas que trabalham inclusive em soluções próprias, mas em alguns casos traz o custo extra que boa parte das pessoas está tentando cortar. Os próprios Correios prometeram revitalizar as antigas caixas postais através de um novo serviço a ser implantado esse ano.

Bom, o caminho já está traçado ou ainda pode haver alguma ruptura nesse espaço? Será que serviços de lockers compartilhados entre amigos pode funcionar? Empresas como a Glovo têm oportunidade? Acho que a briga ainda está aberta. Alguma ideia de como atuar?

Leonardo Brossa é sócio e planejador da Quintal